O Código Penal determina, em seu artigo 64, inciso I, que decorridos mais de cinco anos desde a extinção de uma eventual pena, ou seja, desde que o autor a cumpriu de forma integral, a pessoa não será mais considerada reincidente para os fins da lei. É o que chamamos de prescrição da reincidência.
O artigo 59 do CP, por sua vez, estabelece que os “antecedentes” serão um dos critérios utilizados para a quantificação das penas criminais. Outras previsões legais também mencionam os “antecedentes” do acusado, como critério, por exemplo, de definição da aplicação de suspensão condicional da pena; de substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos; etc.
Em razão de tais previsões, mesmo em casos de ocorrência da prescrição da reincidência, muitos juízes vinham entendendo que a existência de prévia condenação, ainda que não retire a primariedade do acusado, poderia ser considerada como “mau antecedente” e utilizada como fundamento para aumentar uma nova pena imposta, ou para deixar de se aplicar benefícios como a suspensão condicional da pena e outros.
Muito se questionava, inclusive na própria jurisprudência, esse posicionamento, uma vez que ele acabava por impor ao acusado pena de caráter perpétuo – o que é expressamente vedado pela Constituição Federal. Ou seja, uma vez condenado pela prática de crime, o indivíduo levaria consigo, para o resto da sua vida, ao menos a condição de portador de maus antecedentes.
No Supremo Tribunal Federal, havia divergência de posicionamento pela 1ª e pela 2ª Turmas com relação à questão, de maneira que se definiu, ainda em 2019, a existência de repercussão geral sobre a matéria e a necessidade de definição, pelo Tribunal Pleno, de um entendimento único.
Em agosto do corrente ano, o Recurso Extraordinário que discutia a questão foi em definitivo julgado. Infelizmente, em que pesem as precisas colocações dos quatro Ministros que restaram vencidos, fixou-se a tese, defendida pelo Exmo. Min. Relator Luís Roberto Barroso, de que “não se aplica ao reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal”.
Na nossa visão, como muito bem apontado pelo Exmo. Min. Marco Aurélio, “mostra-se inadequado submeter o cidadão à eterna penalização considerando erros passados, em razão dos quais já tenha sido condenado com o consequente cumprimento da reprimenda, observada a ordem natural do processo-crime, no que direciona a apurar para, selada a culpa, executar a pena”. O novo posicionamento do STF, nos dizeres do Exmo. Min. Gilmar Mendes, coaduna-se com a “lógica punitivista perversa que temos perpetrado”.